O primeiro caso de Influenza Aviária de Alta Patogenicidade (IAAP) em uma granja comercial brasileira, confirmado em 16 de maio de 2025 em Montenegro (RS), gerou impactos imediatos no comércio exterior do país, comprometendo temporariamente o status sanitário que o Brasil mantinha desde 2006.
A detecção do vírus em uma granja de aves matrizes, responsável por 18% da produção nacional de ovos férteis para frangos de corte, provocou uma onda de embargos internacionais com efeitos significativos para o maior exportador mundial de frango.
Em 18 de junho de 2025, o Brasil recuperou oficialmente seu status de país livre da gripe aviária, após comunicar à Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) o cumprimento do período de vazio sanitário de 28 dias sem novos casos.
Cronologia da crise e recuperação
Em 15 de maio de 2025, autoridades brasileiras confirmaram o primeiro caso de gripe aviária em uma granja comercial em Montenegro, Rio Grande do Sul. Um segundo foco foi detectado no Parque Zoológico de Sapucaia do Sul, também no RS. Na propriedade afetada, todas as aves e seus ovos foram descartados, com limpeza e desinfecção completa das instalações.
O governo gaúcho instalou cinco barreiras de bloqueio de trânsito de animais e quatro de desinfecção, tendo vistoriado todas as 540 propriedades rurais no raio de 3 a 10 km do foco inicial. Ao todo, foram realizados oito ciclos de visitas no raio de três quilômetros, a cada três dias, e cinco visitas nas propriedades do raio de dez quilômetros, a cada sete dias, totalizando aproximadamente duas mil visitas.
O chamado período de vazio sanitário — crucial para recuperação do status sanitário — iniciou-se em 22 de maio, após a desinfecção completa da granja, com duração mínima de 28 dias. Este prazo é o mínimo internacionalmente reconhecido para que o país volte a ser considerado livre da doença, desde que não haja novos casos confirmados.
O Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) informou oficialmente, em 18 de junho de 2025, à Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) o fim do vazio sanitário, conforme previsto nos protocolos internacionais. Com a notificação, o país se autodeclara livre da influenza aviária de alta patogenicidade (IAAP).
Como destacou a pasta: “Chegamos hoje ao fim do vazio sanitário com a conclusão do foco e a emissão da autodeclaração pelo país de que está livre de gripe aviária em granjas comerciais.”
Impacto nas exportações
Os dados da Secretaria de Comércio Exterior revelam a dimensão do impacto: as exportações de carne de frango in natura do Brasil sofreram uma queda de aproximadamente 25% em volume pela média diária nas duas primeiras semanas de junho/2025, na comparação com o mesmo mês do ano anterior.
No primeiro quadrimestre de 2025, as exportações brasileiras de frango haviam alcançado US$2,5 bilhões, um aumento de 17% em comparação com o mesmo período de 2024. A China liderava o ranking de destinos, respondendo por 17% do total (US$455 milhões), seguida pela Arábia Saudita com 13% e Emirados Árabes Unidos com 11%.
Em termos de estados exportadores, o Paraná liderava com US$1 bilhão, seguido por Santa Catarina (US$598 milhões) e Rio Grande do Sul (US$275 milhões). O Porto de Paranaguá respondeu por 46% do escoamento das exportações, equivalente a US$1,16 bilhão nos primeiros quatro meses de 2025.
As perdas estimadas para o setor variam entre US$100 milhões e US$200 milhões nos próximos 12 meses, dependendo da duração dos embargos.
Segundo o Ministério da Agricultura, entre 50 mil e 100 mil toneladas podem deixar de ser exportadas, considerando o preço médio internacional de US$2 mil por tonelada, o que representa redução de 10% a 20% em relação à média mensal de 465 mil toneladas registrada em 2025.
Especificamente para o Rio Grande do Sul, responsável por 11,52% dos abates nacionais, os prejuízos já ultrapassaram US$47,8 milhões, segundo a Organização Avícola do estado.
Cenário dos embargos e perspectivas de recuperação
Atualmente, 24 países suspenderam totalmente as importações de carne de aves do Brasil, incluindo mercados estratégicos como China, União Europeia, México, Iraque e Coreia do Sul. Outros 16 países limitaram as restrições ao estado do Rio Grande do Sul, enquanto Emirados Árabes Unidos e Japão restringiram apenas produtos provenientes do município de Montenegro.
A tendência à regionalização dos embargos representa um avanço importante nas negociações diplomáticas e comerciais. A África do Sul foi um dos primeiros países a flexibilizar as restrições, limitando-as apenas ao Rio Grande do Sul. O México também reduziu o embargo, antes aplicado a todo o Brasil, para apenas o estado gaúcho.
Com a autodeclaração oficial de status livre da gripe aviária, a expectativa do Ministério da Agricultura é que as relações comerciais com países importadores de frangos e ovos sejam restabelecidas o mais rápido possível. A expectativa é que, com a confirmação internacional do status sanitário, os embarques sejam normalizados nas próximas semanas.
A retomada efetiva das exportações depende das negociações bilaterais com cada país importador, mesmo após o período técnico de 28 dias. O Ministério da Agricultura trabalha para reconquistar mercados em 30 a 60 dias, enquanto a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) projeta normalização parcial até agosto/2025, desde que não ocorram novos focos.
Entre as estratégias de mitigação, destacam-se:
- Regionalização de embargos, com Japão, Arábia Saudita e Emirados Árabes limitando restrições ao RS;
- Substituição de origem, com Santa Catarina e Paraná aumentando em 15% a capacidade de embarque;
- Diversificação de mercados, com negociações avançando com Filipinas, Angola e Cingapura.
No mercado interno, o Citi prevê uma “inundação” de frango e consequente queda de preços para o consumidor brasileiro, com possível redução também nos preços da carne bovina, especialmente cortes mais baratos, devido à migração de consumidores entre proteínas.
O Brasil, que produziu 14,9 milhões de toneladas de frango em 2024, com 35,4% destinados ao mercado externo, agora trabalha para manter sua posição de liderança no mercado global enquanto reconquista a confiança dos parceiros comerciais, tendo demonstrado eficiência no controle sanitário ao manter a doença restrita a apenas uma propriedade e cumprir todos os protocolos internacionais.